Foram muitas as vezes em que ouvi, e ouço, a minha rica avó a dizer que antigamente não havia cá impedimentos para ter filho, os que viessem eram bem-vindos, fossem eles 5 ou 50, tudo se cria. Ela lá teve os seus 6, que não vieram mais, e o maior desgosto da senhora é as netas serem quase todas filhas únicas.
As vezes lá se lamenta que teve muitos filhos e que não pode dar oportunidade de estudar a todos, nem terem empregos bem remunerados… E ai, eu argumento, “podia ter tido menos filhos e assim os que tivesse estavam bem melhor.” Mas não, porque se o Senhor do Céu os enviou era para os ter… “-E sabes, não havia televisão, uma pessoa deitava-se cedo! Não havia luz e o petróleo era caro…”
Pronto, podemos concluir que seria mais ou menos assim: “oh querida, ainda é tão cedo para dormir. Vamos ali num instante ver se ficas prenha de mais um!”
Mas há uns dias, o meu pai, ainda me contou uma história bem mais rebuscada. Contava ele que era tido como uma má família aquela que tinha poucos filhos… Ou seja: -“ Só tens um filho? Andas possuída pelo Diabo!”
Portanto, acabava por existir uma determinada rivalidade entre as famílias da zona. –“ Oh António, a vizinha já ta prenha outra vez. Vai-nos passar a perna!”
-“Deixa estar filha, que logo a noite a gente faz mais um. O cabrão do Quim das Coives não marra na mulher mais do que eu na minha!”
Lá vinha mais uns quantos inocentes a esta vida, que na altura era mais madrasta do que hoje. E todos serviam para ajudar os pais nos trabalhos do campo, que –“desde que caminhe, já ta bom para andar na terra. Somos muitos, todos têm de ajudar”.
Planeamento familiar era coisa do Diabo, métodos contraceptivos era para as meretrizes que vendiam o que tinham de melhor aos homens…
Bem, sou filha única. Neta de uma senhora com 6 filhos e de outra com 10. E bisneta de uma heroína que deu à luz 18 vezes…